6. Transmissão

Uma vez tendo sido apresentada uma explicação genérica do DVB enquanto sistema, vídeo e áudio, segue-se agora o que caracteriza melhor o DVB, a adaptação ao canal de transmissão. Juntamente com a norma MPEG-2 (e mais recentemente MPEG-4), é a descriminação da protecção de canal e da modulação que define o DVB enquanto norma. Tendo em conta que se trata de realizar televisão digital de uma forma dita universal, vários sistemas de comunicação deverão ser utilizados. Deste modo, as normas do DVB apresentam-se em quatro famílias[11]:

a) Televisão Terrestre: Esta abordagem assume-se como a distribuição da televisão digital (DVB) num âmbito do que era feito com a difusão de televisão analógica. Duas classes são consideradas:

- DVB-T, difusão de televisão digital tipicamente para televisor de mesa/estante.

- DVB-H, difusão de televisão digital orientada a dispositivos portáteis e com limitações de processamento e bateria.

b) Satélite: Esta abordagem é orientada para um canal de transmissão satélite para televisão digital. Três sub-classes são consideradas:

- DVB-S e DVB-S2: A norma DVB-S actua ao nível da codificação de canal e modulação para ligações a satélite. A norma DVB-S2 consiste num melhoramento face ao DVB-S. O tipo de terminal a usar estas normas são os mesmo contemplados para o DBV-T.

- DVB-SH: Esta norma regula a transmissão do sinal satélite para terminais do mesmo tipo que os que usam DVB-H.

- DVB-SMATV: Este sistema consiste na distribuição de televisão digital a partir de uma antena colectiva de prato de satélite. Esta antena colectiva está típicamente localizada no telhado de um edificio, podendo várias pessoas aceder à transmissão. Esta norma é um compromisso entre o DVB-S e o DVB-C, pois entre a antena e o receptor é suposto que a transmissão seja feita em cabo coaxial.

c) Cabo:

- DVB-C: Esta variante do DVB é desenhada para as redes dos operadores de cabo (CATV, HFC). Em termos de conteúdos é suposto que seja alimentado tanto por sinais de satélite, programas de estações de televisão locais, entre outros conteúdos. A agregação é feita no head end, sendo todos os sinais recebidos desmultiplexados da cabeça de rede para serem novamente multiplexados para a rede de distribuição.

d) Micro-ondas:

- DVB-MT (DTT)

- DVB-MC (MMDS)

- DVB-MS (MVDS)

Todas estas classes de DVB transportado em micro-ondas são semelhantes. Todas têm como base o DVB-T e permitem uma difusão normal. Uma vez que temos a identificação de todos os modos de transmissão que estão contemplados para esta norma, segue-se a descrição e explicação da norma DVB-T (por ser a mais comum e tendencionalmente a mais disseminada, para além de partilhar muitas características com o DVB-S e DVB-C). Tenciona-se assim, expor o método de funcionamento do DVB de uma forma geral. Quanto às restantes variantes de transmissão, elas apresentam algumas diferenças em determinados detalhes que serão depois apresentados sob a forma dos diferentes diagramas de blocos [12].

6.1 DVB-T

6.1.1 Single Frequency Network
Com o evoluir da tecnologia e com a massificação e taxa de utilização do espectro electromagnético, cada vez que se projectam novos sistemas pretende-se optimizar a eficiência espectral do novo produto/sistema. Tendo isso em mente, quando o DVB-T foi projectado, surgiram duas grandes correntes quanto à utilização espectral: Multi Frequency Networks (MFN) e as Single Frequency Network (SFN). Por uma questão de eficiência espectral, e de poupança energética, as SFN serão alvo de referência deste artigo (fundamentalmente devido à sua maior utilização, e interesse académico também). As SFN obedecem a um princípio de que todos os transmissores são síncronamente modulados com o mesmo sinal e que todos emitem na mesma frequência. Devido à propriedade de multi-caminho típica dos sistemas multi-portadoras (COFDM), todos os sinais que chegam à antena receptora contribuem para que o sinal original consiga ser reconstruído (algo impossível em modulações analógicas ou de portadora única). Contudo, existem algumas limitações deste método que se tem de levar em conta. Uma delas, deriva da interferência interna à rede, visto todos os elementos usarem a mesma frequência. Outra limitação prende-se pelo atraso de sinais de estações mais distantes, que actuam como ruído. Para reduzir estes factores, é proposto a existência de intervalos de guarda entre transmissão de sinais. Um valor típico a determinar, seria o tempo de propagação do sinal entre dois transmissores na rede. Para futuras referências, o leitor é redireccionado para [13].
6.1.2 Codificação de Canal e Modulação
Antes de enviar as streams MPEG-2, é necessário adaptar a informação ao tipo de canal. Como estamos a falar de um canal de difusão, é imperativo dotar a trama de um mecanismo de correcção de erros. Em situações de distribuição de conteúdos em tempo real, é impensável retransmitir a trama, descartá-la ou não impor mecanismos que verifiquem a integridade do sinal. Como tal, é imperativo que o receptor consiga corrigir erros que ocorrem devido a ruído ou características do caminho da transmissão. Para isso, é utilizado um FEC (Forward Error Correction). É também necessário existir um método de sincronização. Para termos um modelo de referência deve ser consultada a figura seguinte.

Figura 6: Diagrama de blocos para o emissor DVB-T conforme a norma

Em relação ao diagrama apresentado, é de referir que o sistema pode ser dividido em duas partes, o conteúdo (relacionado com o MPEG-2) e o modo de transmissão (adaptação ao canal). Em relação ao conteúdo, do ponto de vista de sistema para o DVB-T, este assume-se basicamente como MPEG-2 TS. Em seguida os MPEG-2 TS entram no mundo DVB-T propriamente dito. Contudo, há que relembrar alguns conceitos para melhor compreender a ideia que se transmite nesta secção. Há que considerar o conceito de modulação hierárquica, e o modo como o sinal digital e analógico se comportam em termos de recepção.

Em relação ao primeiro conceito, assume-se como a possibilidade de enviar dois streams conjuntamente, cada um deles com características diferentes mas com o mesmo conteúdo (em termos de vídeo ou áudio).

Incidindo agora sobre o segundo conceito, há que perceber que na televisão analógica assiste-se à degradação gradual da qualidade do vídeo e do áudio, ao passo que em transmissões digitais constata-se que a qualidade na recepção é sempre constante até certo ponto enquanto as condições do meio assim o permitirem. A partir desse ponto, o sinal é totalmente destruído e não pode ser recuperado pelo receptor.

Por forma a contornar (até certo ponto) esta limitação, os dados a serem transmitidos são divididos em dois sinais. O primeiro sinal permite que um serviço básico de televisão seja prestado. Os pressupostos para isto assentam num serviço que debita um baixo ritmo de informação e introduz mecanismos de correcção de erros apertados. Por outro lado se as condições do meio assim o permitirem, o segundo sinal é utilizado para completar o primeiro, resultando assim numa maior qualidade e detalhe dos conteúdos do sinal televisivo. Esta funcionalidade é conseguida à custa do uso de modulação 16-QAM (para o canal de serviço básico) e 64-QAM (para o canal que oferece a melhoria substancial do serviço). Modulação QPSK pode também ser utilizada em casos em que os erros são mais altos e a largura de banda disponível mais baixa. Voltando ao nosso modelo de referência, os primeiros quatro blocos referentes ao DVB-T (paralemanente aos blocos com contorno mais forte, que pretendem não mais que retratar o funcionamento hierárquico), são responsáveis pelo tratamento das streams em termos de codificação de canal.

O primeiro bloco DVB-T, permite simplesmente adaptar as streams MPEG-2 ao tipo de canal onde se realizará a transmissão. É feita também a descorrelação ao nível de byte (energy dispersal) por razões de adaptação à transmissão do sinal. O segundo bloco, "Outer coder" tem como objectivo fornecer uma primeira linha de defesa contra os erros. Para tal, são utilizados códigos Reed-Solomon (204,188) que conseguem a correcção de 8 bytes por cada pacote de 188 bytes (tamanho de um pacote MPEG-2 TS).

O próximo bloco, "Outer interleaver" tem um papel fundamental na correcção de erros. A sua função não é mais do que arrumar os bytes de cada pacote de uma forma não sequencial para que a correcção de erros seja mais eficiente. O erro em vez de ficar concentrado e envenenar a stream ao longo de uma cadeia de bytes, é distribuído ao longo de vários pacotes MPEG-2 TS que sofreram a operação de interleaving. Assim, graças ao código RS (204,188), esses pequenos erros espalhados pelos vários pacotes de stream podem ser corrigidos. Se não fosse utilizada esta técnica, pacotes inteiros não poderiam ser corrigidos pois os erros excederiam a capacidade de correcção. A única desvantagem que este método introduz é o aumento da latência pois um bloco inteiro de informação que tenha sofrido o interleaving, tem de ser recebido antes dos dados poderem ser extraídos. Este bloco e o anterior estão intimamente relacionados.

Em relação ao bloco "Inner coder", este oferece um segundo nível de protecção contra erros. Aqui é feita outra codificação de canal utilizando códigos convolucionais por forma a implementar o FEC. São aceites códigos com relações 1/2, 2/3, 3/4, 5/6 e 7/8. Em relação ao "Inner interleaver", este assume uma função igual à do "Outer interleaver", funcionando contudo em seguida ao "Inner coder". De referir que neste caso, e se o sistema estiver a funcionar em modo hierárquico, ambos os streams MPEG-2 sofrem esta operação sendo por isso "misturados" numa única sequência binária.

Em relação ao "Mapper", é aqui que é feita a modulação sobre o sinal de banda de base. A sequência que entra é binária e é mapeada para símbolos complexos (número real e imaginário). Como atrás referido, são utilizadas modulações QPSK, 16-QAM e 64-QAM.

Figura 7: Modulações utilizadas no DVB-T

No que diz respeito aos bloco identificados como "Frame Adaptation" e "Pilot and TPS signals", estes estão intimamente ligados à transmissão propriamente dita. A função da "Frame Adaptation" é a de agrupar os símbolos (obtidos após a modulação, amplitude e fase) em blocos de tamanho fixo (podendo ser de 1512, 3024 ou 6048 símbolos por cada bloco). Em termos hierárquicos, temos uma trama que é constituída por 68 blocos, e uma super-trama que inclui 4 tramas normais.

Em relação ao módulo "Pilot and TPS signals", este existe por uma questão de sincronização. Em cada bloco, são inseridos sinais adicionais, o sinal Piloto e o sinal TPS (Transmission Parameters Signalling). O primeiro, é utilizado para sincronização e equalização ao passo que os do tipo TPS são utilizados para expedir parâmetros da transmissao (numerar tramas numa super-trama, modulação, informação hierárquica, relações de códigos internos, comprimento do intervalo de guarda e modo de transmissão) e também identificar a célula de onde parte.

Quanto aos blocos "OFDM" e "Guard interval insertion", estes deixam os sinais em condições de serem emitidos. O primeiro é responsável por traduzir os blocos que vêm da "Frame adaptation" para um esquema OFDM. Podem ser utilizadas 2048, 4096 ou 8192 portadoras. Contudo para simplificar o elemento receptor, são inseridos intervalos de guarda cujo tamanho pode ser 1/32, 1/16, 1/8 ou 1/4 do tamanho do bloco original (sequência de símbolos). Tal justificação para estes intervalos de guarda prende-se pela utilização de SFNs.

A respeito dos últimos blocos, "DAC " e "Front end", trata-se da transformação do sinal digital para um sinal analógico para poder ser emitido. Esta modulação é feita para a banda VHF (30 MHz - 300 MHz) ou para UHF (300 MHz - 3 GHz). Cada sinal DVB-T pode ser transmitido em canais de 6, 7 ou 8 MHz a partir de uma antena de difusão [13].

Quanto ao receptor, todos estes passos são efectuados mas por ordem inversa.

6.2 DVB-T vs restante família DVB

Uma vez que tendo apresentado a norma DVB-T em detalhe e a título de exemplo, temos agora todo o know-how para perceber como a família DVB actua.

Como já foi mencionado na introdução desta secção sobre transmissão, o elemento diferenciador de cada norma DVB encontra-se precisamente na adaptação ao canal para o qual foi projectado. Por forma a obtermos um cenário comparativo, são apresentadas as figuras 8, 9 e 10 para as restantes tecnologias da família DVB. Fundamentalmente, o conceito e os mecanismos são em todo semelhantes aos do DVB-T,existindo contudo algumas diferenças tanto a nível de codificação, "interleaving", modulação ao tipo de canal e necessidades de sincronismo ao nível de canal [12] e [14].

Figura 8: Diagrama de blocos funcionais para um codificador de DVB-C

Figura 9: Diagrama de blocos funcionais para um codificador de DVB-S

Figura 10: Diagrama de blocos funcionais para um codificador de DVB-H


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