4. Mercado e Aspectos Legais

À imagem do que sucede com todos os produtos desenvolvidos, o sucesso dos codificadores de áudio não depende apenas das suas características técnicas. Existem outros factores que são determinantes para o desenvolvimento de um bom compressor de áudio, como o plano de negócios adoptado, o aproveitamento ou não de oportunidades únicas que possam eventualmente surgir, a compatibilidade com produtos e serviços já existentes, acordos com as empresas certas, etc.

Assim sendo, têm-se observado nas últimas duas décadas vários factores que influenciaram e continuam a influenciar o sucesso e a evolução dos vários codecs de áudio, tal como será analisado ao longo deste capítulo. Obviamente que ao nível do consumidor se destacam dois codificadores, o MP3 e o AAC, existindo outros compressores com créditos firmados a nível profissional (cinema, edição de áudio, etc.). Denota-se no entanto que o mercado só consegue “absorver” um número muito limitado de codificadores, dada a crescente uniformização e globalização do mundo em geral e do mundo electrónico em particular.


4.1. O nascimento e a morte do Napster

Com a introdução da música digital e o aparecimento dos
primeiros codificadores de áudio, nomeadamente o MP3, desencadeou-se um novo movimento de partilha de ficheiros de áudio, mais especificamente de ficheiros de música. Este facto deveu-se essencialmente à facilidade de cópia que o formato digital permite e principalmente à reduzida dimensão dos ficheiros comprimidos através de codificadores lossy.

Aproveitando este movimento foi criado em 1999 um serviço online para partilha de ficheiros de musica denominado Napster. Este serviço permitia aos seus utilizadores copiar e distribuir ficheiros MP3 entre eles, proporcionando a obtenção gratuita de títulos musicais vendidos até à altura apenas em lojas convencionais, em Compact Discs ou, recuando ainda mais no tempo, em vinil.

Ao mesmo tempo que se observava uma crescente popularidade do formato MP3, resultando no domínio do mercado da codificação de áudio lossy, começava-se a associar esta partilha de ficheiros a um novo tipo de pirataria, no qual as empresas discográficas representavam os principais lesados. Sendo assim, em 2001, depois de uma longa batalha judicial, o Napster acabou mesmo por terminar a sua actividade, o que representou uma vitória para a indústria discográfica e um ligeiro revés para a codificação de áudio, mais especificamente para o formato MP3. [11]


4.2. O ínicio da venda online de conteúdos áudio

A popularidade atingida pela partilha de ficheiros de música,
apesar de ofensiva, captou a atenção da indústria. Era óbvio o impacto que este fenómeno tinha gerado no público em geral. As pessoas queriam adquirir música de uma forma mais cómoda e rápida. Mais importante ainda, queriam guardar inteiras colecções discográficas num pequeno disco rígido, dispensando tempo e espaço para outras coisas que não autênticos montes de caixas de CDs.

Assim sendo, e com a afirmação da Internet como principal meio de comunicação para o século XXI, a partilha de títulos musicais pela rede era vista como uma excelente oportunidade para a modernização da indústria discográfica. Bastava então ultrapassar duas fases: atingir um acordo entre as empresas discográficas mais importantes para a venda online dos seus conteúdos e garantir a segurança desses conteúdos, protegendo-os de cópias ilegais.

Esta oportunidade não foi perdida, e em 2003, dois anos após o fecho do Napster, foi lançada a iTunes Music Store da Apple.
Este “armazém” de música digital acabou por revolucionar a indústria musical através de um formato pouco conhecido até então, o AAC. Este oferecia o que o MP3 não tinha conseguido oferecer: protecção contra as cópias ilegais e a sua consequente distribuição através da Internet. Estas garantias eram e são dadas pelo software DRM (Digital Rights Management).

Como resultado deste avanço tecnológico, rapidamente se obtiveram os acordos necessários para a venda dos títulos mais importantes através desta loja online. Até hoje o número de títulos disponíveis para compra tem aumentado, sendo oferecidos actualmente milhões de músicas a preços mais baratos e com uma maior flexibilidade de escolha que os CDs. [11]


4.3. iPod

Ao mesmo tempo que aumentava a partilha de ficheiros MP3 através da Internet (como analisado no ponto 5.2.) começavam a aparecer leitores de MP3 que permitiam aos seus utilizadores uma portabilidade nunca antes vista. A possibilidade de levar um elevado número de álbuns de música dentro do bolso para qualquer lado era algo com que nenhum leitor de CDs conseguia competir.

Mas, com o virar do milénio, e quando já se produziam PDAs e telemóveis com capacidade de armazenamento de música, começaram os problemas legais para este tipo de partilha,
culminando no fim do Napster. Foi nesta época de incertezas e de um certo vazio para o mercado dos codificadores de áudio que a Apple decidiu lançar o seu leitor de música, o iPod. Este leitor portátil tornou-se rapidamente num sucesso de vendas. Possibilitando a leitura de ficheiros MP3 e AAC, o iPod conseguia abranger os utilizadores que continuavam a utilizar o MP3 (partilhando-os agora através de sistemas legais, como os Peer To Peer) e os que passaram a comprar música através da recém-criada iTunes Music Store. Esta estratégia acabou por reanimar o mercado do MP3 e manter activo o formato AAC. [5]

Com cerca de 150 milhões de unidades vendidas em poucos anos, o iPod passou de gadget tecnológico para ícone cultural, o que vai permitindo uma constante evolução e inovação ano após ano.  

De notar que apesar de possuir o seu próprio formato áudio (WMA), a Microsoft não conseguiu até hoje entrar de forma consistente no mercado dos leitores de áudio digital. Verifica-se por outro lado que o lançamento da versão do iTunes para o Windows contribuiu em parte para o sucesso final do iPod.


4.4. Estado da Arte

Actualmente, apesar de ainda dominar o mercado, assiste-se à entrada de novos concorrentes ao iPod (Figura 9). Para além de vários leitores de música lançados por empresas como a SanDisk, a Creative ou a Microsoft, existem vários fabricantes de telemóveis e PDAs com novos produtos que integram uma solução que combina um telemóvel e um leitor multimédia. Mais uma vez a Apple foi pioneira com a introdução do iPhone em 2007.



Figura 9, Evolução da venda de leitores MP3



Todas estas soluções acabam por confirmar o formato MP3 como líder incontestável no mercado dos codificadores de áudio (dada a sua popularidade inicial e a sua facilidade de cópia), apesar do inquestionável sucesso das lojas de venda de música online (Figura 10) e consequente sucesso do AAC.



Figura 10, Evolução da venda de música online no Reino Unido



Dado o pouco conhecimento do formato Vorbis por parte do público em geral, este codificador continua a ter alguma dificuldade em entrar no mercado da música digital. Ainda assim, ocupa hoje uma importante posição na codificação de áudio de jogos de computador e software em geral. Isto porque as empresas que os desenvolvem vêem neste codificador uma excelente oportunidade de adquirir um bom produto sem qualquer encargo adicional e dado não existir uma necessidade de compatibilidade de formatos áudio, a pouca utilização do mesmo não se comporta como um entrave à sua escolha.

Em relação aos codificadores sem perdas (lossless), verifica-se que estes centram-se essencialmente no mercado dos audiófilos, onde a preocupação principal passa pela qualidade áudio e não pela dimensão do ficheiro comprimido. O FLAC e outros codificadores lossless são assim muito utilizados em estúdios de gravação e em sistemas de som de alta-fidelidade.

Finalmente, de notar que passados quase 20 anos desde a criação do MPEG-1, e consequentemente do MP3, assistir-se-á ao fim da licença deste codificador, passando a ser possível a sua utilização sem o pagamento de qualquer licença.